O HOMEM CORDIAL, com Paulo Miklos e Thaíde, estreia nesta quinta, 11/5
“A motivação inicial do projeto era tratar da injustiça social”, conta o diretor Iberê Carvalho (“O Último Cine Drive-in”) sobre seu mais novo longa O HOMEM CORDIAL, que chega aos cinemas nesta quinta-feira, 11 de maio, nas seguintes praças: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Campinas, Curitiba, Fortaleza, Goiânia, Maceió, Manaus, Natal, Niterói, Palmas, Poços de Caldas, Porto Alegre, Recife e Salvador. A distribuição é da O2 Play.
O filme é uma coprodução entre a Quartinho Direções Artísticas, Acere, Pavirada Filmes e Momento Filmes. Em Gramado, ganhou o prêmio de Melhor Ator (Paulo Miklos) e Trilha Musical. Teve a sua estreia internacional no Cairo International Film Festival.
O longa traz como protagonista o músico e ator Paulo Miklos, interpretando o líder de uma banda de rock fictícia, Instinto Radical, e que traz em suas músicas questões sociais. Ela foi concebida como se fosse uma das muitas bandas de rock que fizeram sucesso nos anos 1980 e 1990 no Brasil. Para isso, era preciso criar músicas de poucos acordes, refrão de fácil assimilação e um discurso político um tanto quanto ingênuo. Afinal de contas, a maioria das bandas de rock desse período era composta por adolescentes brancos, de classe média ou média-alta, que tinham o privilégio de poder falar o que queriam, pois o Brasil já estava saindo do período ditatorial.
Aurélio (Miklos) se envolve num incidente, no qual um policial acaba morto e um vídeo viraliza na internet. No início da trama, não sabemos muito bem o que realmente, mas o músico se torna alvo de um julgamento e cancelamento na internet, colocando até mesmo sua vida em risco.
“As redes sociais são o ambiente perfeito para que ocorra o efeito manada, ou seja, quando um grupo de indivíduos segue a opinião ou ação de outros de forma irracional, sem analisar os fatos e fundamentos. No filme, vemos como cada comentário, cada postagem, cada curtida ou compartilhamento em uma fake news tem um impacto direto na vida de alguém no mundo real. E esse impacto se potencializa dependendo de que grupo social ou étnico você pertence”, explica o diretor Iberê Carvalho.
Sociólogo por formação, Iberê escreveu o roteiro em parceria com o uruguaio Pablo Stoll (“Whisky”), e o que os guiava era o desejo de escrever uma história que se passasse em uma única noite e que levantasse questões, de forma crítica, sobre a sociedade brasileira atual, e percebeu que de alguma maneira as situações que estávamos trazendo no roteiro do filme, dialogavam com o conceito de O HOMEM CORDIAL, criado por Sérgio Buarque de Holanda no livro “Raízes do Brasil”, publicado em 1936.
O HOMEM CORDIAL, ao contrário do que muitos pensam, não se refere a uma característica amável e gentil de nós brasileiros. Sérgio Buarque se referia à Cordial (palavra que vem de Cordis, que em latim significa coração) como um sujeito passional, que age pelo afeto, e esses afetos acabam mascarando as relações de conflito e de extrema violência de nossa sociedade. O título é uma provocação crítica e um convite para uma reflexão sobre nossa identidade.
O outro tema central do filme entra logo em seguida em cena, quando se descobre que o incidente também envolve um garoto negro. “O HOMEM CORDIAL tem como um de seus temas principais o racismo, a partir de um ponto de vista que busca discutir a branquitude como uma raça. Discutir a branquitude me parece fundamental em uma postura antirracista. E a polícia, no Brasil, é a instituição criada para garantir, com o uso da força, o privilégio da branquitude”, completa o diretor.
Para escrever o filme, os roteiristas pesquisaram sobre a origem e os casos contemporâneos de linchamentos (virtuais e/ou físicos), sobre os casos de violência policial que tiveram crianças como vítimas, sobre o racismo estrutural e também sobre o rock brasileiro dos anos 1980.
“No Brasil, que teve sua formação social e econômica profundamente marcada pela escravidão, é impossível falar de desigualdade social sem tocar na questão racial. Eu diria que a questão racial é o tema principal de O HOMEM CORDIAL. Contudo, como eu, um homem branco, poderia tratar desse tema? Ora, a questão racial é sim uma questão que precisa ser tratada pelos brancos. Afinal, o racismo é cometido, geralmente, por quem?”.
Pablo Stoll, que tem uma relação bem próxima com o Brasil, conta que fazer o filme foi um desafio, mas, desde o início, sabiam bem sobre o que queriam falar: o crescimento do discurso de ódio na sociedade. Eles tinham uma versão do roteiro praticamente pronta, quando surgiu um vídeo do músico Chico Buarque assediado em um restaurante, e, nesse episódio, encontraram o filme.
“Jogamos fora o outro roteiro e começamos a escrever um novo, baseado na jornada de uma noite de um ‘homem cordial’ que não consegue acreditar no que sua cidade, seu país, se tornou. Uma viagem por um inferno em que está submerso e que se revela envolvente e insondável. Já o filme, graças à direção de Iberê, cresceu bastante com as tomadas de decisão que só um grande diretor faria”, explica o uruguaio.
Paulo Miklos foi outra parceria fundamental para a existência de O HOMEM CORDIAL. “Paulo tem escuta, é sincero, muito disponível e generoso com os colegas de cena. Nas cenas de música, foi muito bonito ver como Paulo se transforma completamente quando sobe num palco segurando uma guitarra. São mais de 40 anos de experiência com uma das maiores bandas de Rock do Brasil de todos os tempos. Todo esse passado está impresso no filme com uma potência impressionante”, diz Carvalho.
No filme, outro elemento importante é a cidade de São Paulo, que entra quase como uma personagem aqui. “Nosso protagonista vive a sensação de estar constantemente sendo observado e julgado. A cidade de São Paulo, com todos seus edifícios, veículos e transeuntes representa uma ameaça a Aurélio. Além disso, a história precisava de uma grande metrópole que nunca dorme e que possibilitasse uma estrutura de road movie, onde a jornada vai se desenrolando pela cidade e vai, a cada encontro, apresentando situações que só uma cidade como São Paulo poderia proporcionar.”
Na fotografia, assinada por Pablo Baião, o diretor desenvolveu o conceito de câmera do filme que é muito diferente de tudo que havia experimentado até aqui em sua carreira. “A câmera na mão, operada de forma magistral pelo Pablo, tem uma proposta de nos dar a sensação de que nada do que vemos em tela foi ensaiado ou planejado. É uma câmera que, sobretudo na primeira metade do filme, tem sempre o protagonista em quadro. Como um algoz que vigia cada um de seus passos, esperando por um deslize, por algo que possa usar contra ele.”
Lançando o filme naquele que define como “um país pós-trauma”, Iberê destaca que, nos últimos tempos, “vivemos um período de normalização da barbárie. Um momento onde a violência, que sempre existiu de forma velada, ganhou status de discurso público e, em alguns casos, até de política de Estado. E é nesse contexto, de barbárie, que ocorrem os linchamentos. Qual papel de cada um de nós nessa cultura do linchamento? Será que basta meu engajamento nas redes sociais? Será que tenho tido uma atitude antirracista no meu dia a dia? Enfim, acredito que o filme pode estimular a reflexão sobre nosso comportamento nesse momento de reconstrução da civilidade, dos direitos humanos e da democracia”.
Sinopse
Aurélio é vocalista de uma famosa banda de rock que fez muito sucesso até o final dos anos 1990. Na noite de retorno de sua banda aos palcos, viraliza na internet um vídeo que o envolve na morte de um policial militar. Ninguém sabe o que de fato aconteceu, mas o astro passa a ser alvo de grupos radicais. Aurélio, então, se vê inserido em uma tensa e violenta jornada pelas ruas de São Paulo. Durante uma única noite, encontrará figuras importantes de sua carreira e Helena, uma jovem jornalista determinada a descobrir o que realmente aconteceu.
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